0000633-83.2013.4.05.8308 Classe: 2 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Última Observação informada: NO GAB (21/07/2014 08:59)
Última alteração: JDODP
Localização Atual: 8a. VARA FEDERAL
Autuado em 07/06/2013 - Consulta Realizada em: 30/07/2014 às 23:09
AUTOR : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADOR: BRUNO BARROS DE ASSUNÇÃO E OUTRO
RÉU : JOSÉ ROBSON RAMOS DE AMORIM
ADVOGADO : CARLOS EDUARDO LEAL AGUIAR SILVA E OUTROS
8a. VARA FEDERAL - Juiz Titular
Objetos: 01.03.08 - Improbidade Administrativa - Atos Administrativos - Administrativo
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29/07/2014 00:00 - Publicação D.O.E, pág.44/46 Boletim: 2014.000075.
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25/07/2014 12:03 - Sentença. Usuário: JDODP
Processo n.º 0000633-83.2013.4.05.8308


SENTENÇA

I. Relatório

Trata-se de ação de improbidade proposta pelo Ministério Público Federal em face de José Robson Ramos de Amorim.

O autor alegou que o Município de Lagoa Grande-PE firmou convênio com o Ministério da Ciência e Tecnologia em 29/12/2006 (01.0098.00.2006), época em que o réu figurou como Prefeito (mandato 2005-2008). Aduziu que o órgão concedente desembolsou o importe de R$ 125.655,60 (cento e vinte e cinco mil seiscentos e cinquenta e cinco reais e sessenta centavos), com contrapartida de R$ 14.640,00 (catorze mil seiscentos e quarenta reais), tendo ocorrido duas renovações, ensejando encerramento em 31/08/2008.

O Parquet sustentou que o réu não prestou as respectivas contas, decorrendo in albis o prazo de 60 (sessenta) dias posteriores ao término do convênio, permanecendo inerte, também, após duas notificações destinadas à regularização da situação do Convênio, ocasionando a instauração de Tomada de Contas Especial, que concluiu pela reconhecimento de irregularidade, consistente em omissão do dever de prestar contas.

O MPF pleiteou a condenação do réu nas sanções previstas no artigo 12, III, da Lei n.º 8.429/92.
Juntou os documentos de fls. 12-50.

Instado a apresentar manifestação preliminar, o réu peticionou às fls. 57-63, acostando os documentos de fls. 64-194.

Às fls. 199- 203, o MPF ratificou os pleitos inicias.

Em decisão de fls. 204/205, a petição inicial foi recebida.

A União informou a ausência de interesse em integrar a lide (fls. 210-212).

Em contestação de fls. 218-225, o réu aduziu que a equipe técnica responsável pelo cumprimento do convênio não apresentou as respectivas contas, nem lhe comunicou a situação, ensejando a instauração de Tomada de Contas Especial. Acrescentou que inexistiu desídia ou descaso, pois a omissão teria decorrido de "empecilhos ocasionados pela eclosão de um processo eleitoral extemporâneo".

O réu sustentou, ainda, que apresentou as contas em 05/06/2012, época em que o processo de Tomadas de Contas já se encontrava em fase avançada, razão pela qual ofertou Recurso de Revisão. Asseverou a inexistência de ato de improbidade, diante da realização da prestação de contas e da regularidade na aplicação dos recursos oriundos do convênio.

Juntou os documentos de fls. 226-228.

Às fls. 229, foi certificada a ausência de manifestação do Município de Lagoa Grande-PE, intimado conforme fls. 216.

Em petição de fls. 232, o MPF pleiteou o julgamento do feito, anunciando o desinteresse em produzir outras provas.

O réu pleiteou a oitiva de testemunhas, deferida por este Juízo e produzida consoante termo e mídia de fls. 241-244.

Em despacho de fls. 246, foi determinada a intimação das partes para apresentarem memoriais.

Às fls. 251-259, o Ministério Público Federal pugnou pela condenação do réu nas sanções do artigo 12, II, da Lei n.º 8.429/92.

Alegações Finais do réu às fls. 262-267.

Em despacho de fls. 268, foi determinada a intimação do MPF para que se manifestasse sobre a informação de tramitação em Juízo Estadual de demanda com causa de pedir e pedidos coincidentes.

Após obtenção de resposta do Juízo Estadual, o Parquet pugnou pela continuidade do feito (fls. 282-289 e 292).

É o breve relatório.

II. Fundamentação

Inicialmente, consigne-se que, consoante despacho de fls. 268, foi determinada a manifestação do MPF sobre eventual ação de improbidade em trâmite na Justiça Estadual, anunciada no processo administrativo, proposta pelo Município de Lagoa Grande-PE em face do réu.

Oficiado o Município de Lagoa Grande-PE, restou esclarecido que a demanda tem objeto diverso, razão pela qual não influi no prosseguimento do presente feito.

Ainda em seara prefacial, consigne-se que as alegações finais ofertadas pelo réu tem requerimento de imposição de "penalidade pela prática delituosa". São os termos da petição:

"[...] Em razão de restar caracterizada o ato de improbidade administrativa por parte de ex-gestor, ora demandado, deve esse ser penalizado pela prática delituosa, bem como, obrigado a devolver o valor do convênio, devidamente atualizado aos cofres públicos, conforme descritivo de débito encaminhado pelo Ministério da Integração Social e corroborado ao longo da instrução processual. Ante o exposto, requer seja reconhecida a robusta prova para condenação requerendo a fixação de sanções para o ato imputado, em razão de grade relevância do fato.[...]" (fls. 266/267)

Ocorre que a petição é dotada, predominantemente, de efetiva insurgência em relação aos fatos narrados na inicial, inclusive com expressa manifestação sobre o afastamento da condenação (fls. 266), razão pela qual a conclusão das alegações finais consiste em erro material na sua confecção, não comprometendo o exercício do contraditório e da ampla defesa, consoante se depreende do seu conteúdo.

Sendo assim, inexistindo preliminar/prejudicial a ser apreciada, passo à análise do mérito.

Cuida-se de ação civil pública, alegando o autor que as condutas do réu caracterizam atos de improbidade administrativa, em virtude da regra do artigo 11, VI, da Lei de Improbidade Administrativa (LIA), por violação aos princípios da administração pública, diante do descumprimento do dever de prestar contas. Eis o tipo imputado em questão:

"Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

[...]
VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo. [...]"

Impõe analisar, a partir de então, se há provas concretas de ter o réu praticado as condutas narradas pelo autor e, em caso positivo, se elas se subsumem ao tipo apontado.

Verifica-se que, consoante Relatório de Auditoria confeccionado pela Controladoria Geral da União em 2010 (fls. 33-35), concernente ao Convênio n.º 01.0098.00/2006, firmado entre o Município de Lagoa Grande-PE e o Ministério da Ciência e Tecnologia (vigência 29/12/2006 a 31/08/2008), foram expedidas notificações ao agente responsável pela prestação de contas, José Robson Ramos de Amorim, ora réu, não tendo o mesmo apresentado defesa ou justificação, concluindo-se pela omissão no dever de prestar contas dos respectivos recursos.

Consoante arquivo contido em mídia disponibilizada pelo TCE (mídia acostada às fls. 45, arquivo "2996388v2-89+-+-463222117"), constata-se o recebimento de correspondência emitida pelo Tribunal em julho/2011, encaminhada ao endereço do réu cadastrado perante a Receita Federal, referente à concessão de prazo para apresentação de defesa.

Em acórdão emanado do Tribunal de Contas da União em 24/01/2012 (fls. 17-23), referente ao Processo n.º TC 002.629/2011-9 (Tomada de Contas Especial), após a decretação da revelia de José Robson Ramos de Amorim, foram julgadas irregulares as contas do réu, com condenação ao pagamento dos valores vinculados ao convênio (R$ 99.241,70 + 26.413,80), acrescido de multa no importe de R$ 9.000,00.

Em sua contestação, o réu aduziu que a equipe técnica responsável pela prestação não apresentou as contas em comento, destacando, ainda, a ocorrência de "empecilhos ocasionados pela eclosão de um processo eleitoral extemporâneo".

Entretanto, não restou demonstrado nos autos a ocorrência de fato capaz de impedir a prestação de contas em epígrafe, de modo a sequer possibilitar a apresentação de justificação pelo réu. Os depoimentos testemunhais não comprovaram tais alegações. Ao revés, a testemunha Regina Nunes de Oliveira ratifica que não houve prestação de contas tempestivamente.

Ademais, o procedimento administrativo de revisão proposto pelo réu não tem o condão de elidir a ilegalidade em apreço, vez que a prestação de contas deveria ocorrer em 2008, porém o réu somente se manifestou perante o Ministério da Ciência e Tecnologia em junho/2012 (fls. 74), data em que já persistia o julgamento de irregularidade das contas pelo TCU.

Especificamente sobre tal petição do réu, o TCU se pronunciou no seguinte sentido:

"ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão da primeira Câmara, diante das razões expostas pelo relator, em: 9.1. cientificar à Secretaria-Executiva do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação que: 9.1.1 Não cabe àquele ministério analisar documentação que deva ser apresentada a este Tribunal ou se pronunciar sobre perda de objeto de tomada de contas especial que tenha sido julgada por esta Corte; 9.1.2. após o julgamento da tomada de contas especial, documentos porventura apresentados pelo responsável perante o ministério não tem o condão de afastar a penalidade imposta pelo Tribunal ou os efeitos da condenação; [...] 9.2.1 informe ao sr. José Robson Ramos de Amorim que o fato de ter encaminhado ao órgão concedente documentação que, supostamente, demonstra a boa e regular aplicação dos recursos federais, em nada modifica o Acórdão 182/2012-TCU - 1ª Câmara, e que a condenação que lhe foi imposta, e o consequente julgamento das contas como irregulares só poderão ser rediscutidas administrativamente por este Tribunal mediante o meio processual adequado, nos termo do artigo 35 da lei n.º 8.443/1992." (fls. 73 - 16/04/2013)

Verifica-se que o réu protocolou perante o TCU um "recurso de revisão", datado de 29/07/2013 (consulta processual anexa). Não obstante a denominação do instrumento processual, trata-se de mecanismo que mais se aproxima de uma rescisória, tendo em vista que tem fundamentação vinculada e correlata a "erro de cálculo nas contas", "falsidade ou insuficiência de documentos em que se tenha fundamentado a decisão recorrida" ou "superveniência de documentos novos com eficácia sobre a prova produzida", inclusive sem efeito suspensivo, consoante artigo 35 da lei n.º 8.443/92.
Sobre o tema, mutatis mutandis, elucida a jurisprudência:

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ENCARGOS DE SUCUMBÊNCIA. DESCONSTITUIÇÃO DO TÍTULO EXECUTIVO POR ACÓRDÃO DO TCU PROFERIDO EM RECURSO DE REVISÃO APÓS O AJUIZAMENTO DA AÇÃO DE EXECUÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS INDEVIDOS. [...]3. O Recurso de Revisão encontra-se previsto na Lei Orgânica do TCU, de nº 8.443/92, que em seu art. 32 elenca os recursos cabíveis em processos de tomada ou prestação de contas, no caso, I) reconsideração; II) embargos de declaração; e III) revisão. 4. O TSE, a respeito do Recurso de Revisão, já se posicionou (nos precedentes: AgR-REspe nº 31942/PR, red. p/ ac. Min. Carlos Ayres Britto, PSESS 28/10/2008; AgR-REspe 33861/CE, rel. Min. Joaquim Barbosa, PSESS 16/12/2008; dentre outros) no sentido de entender que apesar da nomenclatura, este possui natureza jurídica de ação rescisória. [...] (AC 200980000056956, Desembargador Federal Emiliano Zapata Leitão, TRF5 - Primeira Turma, DJE - Data::04/03/2011 - Página::51.)

Sendo assim, considerando que a presente ação de improbidade tem fundamento na violação do dever de prestar contas e que o termo final para a sua prestação ocorreu em 2008, constata-se que as petições protocoladas pelo réu em 2012 e 2013, esta última, inclusive, após a notificação expedida na presente ação, não elide a sua conduta ilegal.

Isto porque, consoante cediço, a prestação de contas é dotada de especial relevo, consistindo em meio de fiscalização da utilização de recursos públicos. Não se trata de medida burocrática, meramente formalista. Ao revés, cuida-se de dever do administrador perante o órgão concedente, os órgãos de fiscalização interna e externa e, principalmente, perante a sociedade.

Tanto é assim que a prestação tardia, embora possa afastar o ressarcimento do débito, não deve elidir a multa aplicada pelo TCU, dotando de efetividade o dever de prestação de contas pertencente ao gestor público, consubstanciado na demonstração de regular emprego de recurso público, mediante tempestiva prestação de contas.

Além disso, eventual aprovação das contas em ato futuro do TCU não afastará o reconhecimento judicial de ato de improbidade administrativa, a teor do artigo 21, II, da Lei 8.429/92, sem olvidar que a presente demanda tem por causa de pedir a prática de violação a princípios administrativos, cuja aplicação das respectivas sanções independe de efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público.

Sobre o tema, com peculiar pertinência, transcreve-se o seguinte julgado:

CONSTITUCIONAL, PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR - PNAE. NÃO PRESTAÇÃO DE CONTAS DOS VALORES REPASSADOS ATRAVÉS DE CONVÊNIO. CONDENAÇÃO DA RÉ. AUSÊNCIA DE RECURSO DA PARTE CONDENADA. APELO INTERPOSTO COM VISTAS À MAJORAÇÃO DA SANÇÃO APLICADA. PARÂMETROS LEGAIS DE MENSURAÇÃO DA PUNIÇÃO (ART. 12 DA LEI Nº 8.429/92) E PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Apelação interposta contra sentença de parcial procedência do pedido de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, ajuizada com vistas à responsabilização da ré, ex-prefeita, pela não prestação de contas relativas ao Convênio nº 3863/94, firmado entre o Município de Boqueirão/PB e a União/Ministério da Educação, no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar - PNAE, com o repasse do montante de R$175.853,00. 2. O Juízo a quo reconheceu a existência de ato ímprobo tipificado no art. 11, VI, da Lei nº 8.429/92, e condenou a ré na pena de pagamento de multa civil de cinco vezes o valor da última remuneração percebida pela ré, enquanto Prefeita. 3. A ré não recorreu, mas o MPF, litisconsorte ativo, apelou, pretendendo a majoração da condenação. 4. Procede a insurgência do recorrente. Considerados os parâmetros legais (art. 12 da Lei nº 8.429/92), bem como os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e realçando-se, especialmente, a relevância da área social afetada com o descompromisso da ré e o seu silêncio por mais de dez anos (conte-se do momento em que deveria ter prestado contas, e não o fez, até o ano de 2009, quando, nesta actio, apresentou mero formulário, sem qualquer lastro documental demonstrativo da correta aplicação dos recursos públicos repassados), revelador de descaso com a coisa pública e de desrespeito aos órgãos de controle, mostra-se apropriada a majoração da condenação, de modo que a ré deve ser punida com as seguintes penas: suspensão dos direitos políticos por 3 anos; pagamento de multa civil de 5 vezes o valor da última remuneração percebida pela ré, como Prefeita; proibição de contratar com o Poder Público e de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, pelo prazo de 3 anos. 5. É preciso pôr fim à cultura nefasta de que prestação de contas é algo secundário e formal, a ensejar a não condenação ou punições mais brandas, quando tal medida é essencial à constatação da aplicação adequada dos recursos públicos que são repassados em prol da comunidade. 6. "[...] De fato, ao se pronunciar o Ministro Benjamin Zymler, destacou: 'Cabe louvar o excelente trabalho da Secretaria de Recursos que aferiu a compatibilidade entre as informações Conob/Siafi e os extratos bancários apresentados. Restou demonstrado, ainda, que as movimentações financeiras retratadas nos extratos bancários são consonantes com os documentos atinentes à aquisição dos bens e informações fiscais. Destarte, compreendo que os documentos acostados aos autos em sede recursal permitiram aferir o liame probatório entre os recursos repassados e as despesas realizadas./Não obstante, o recorrente não logrou justificar a omissão no dever de prestar contas, alegando tão somente que a prestação de contas não foi apresentada em decorrência de falhas administrativas./Consoante recente jurisprudência desta Corte, a omissão, com posterior prestação intempestiva das contas, pode elidir o débito, no caso de comprovada aplicação regular dos recursos, mas, nos termos do Regimento Interno, não sana a irregularidade inicial do gestor e determina o julgamento das contas pela irregularidade, com eventual aplicação de multa'. Ainda mais incisivo é o pronunciamento do Ministério Público com atuação no TCU: 'Consoante bem demonstrado pela Serur (fls. 53/72 e 75, anexo 4), os elementos acostados aos autos, tais como, extratos bancários, notas fiscais e cópias dos cheques, formam um conjunto probatório coerente e consistente, que se mostra hábil a comprovar a regular aplicação dos recursos federais repassados ao Município de São Lourenço da Mata/PE por força do convênio em tela e, por conseguinte, a afastar o débito imputado ao sr. Jairo Pereira de Oliveira pelo aresto recorrido./Ainda em linha de consonância com a análise empreendida pela Serur, entende este Órgão Ministerial que deve permanecer a irregularidade das contas do responsável e a sua apenação com multa, no valor fixado, por considerar a omissão no dever de prestar contas falha da maior gravidade no regime republicano./A omissão no dever de prestar contas viola princípio fundamental da República, constitui ato de improbidade administrativa (Constituição Federal, artigo 70, parágrafo único, c/c artigo 93 do Decreto-Lei 200/1967 e artigo 11, inciso VI, da Lei 8.429/1992) e faz nascer a presunção de desvio dos recursos, conforme assentado na jurisprudência desta Corte (v.g. Acórdãos 162/2004, 129/2004, 94/2004, 61/2004 e 1.498/2003, todos da 2ª Câmara), presunção esta afastada no presente caso concreto./Além disso, não se deve perder de vista todo o gasto público incorrido pela União em razão da conduta desidiosa do responsável, gasto este necessário para instauração e processamento de tomada de contas especial, tanto no âmbito do órgão concedente como nessa eg. Corte de Contas. Não se diga que a estrutura para tanto já está montada e que o custo, portanto, seria o mesmo. Primeiro, porque essa estrutura está mais do que sobrecarregada, demandando mais aporte dos escassos recursos públicos. Segundo, por que essa estrutura somente existe na dimensão atual por conta do comportamento negligente de numerosos gestores. Não fosse sua conduta, poderiam os órgãos da União certamente despender seus esforços e recursos em outras atividades que melhor poderiam atender às necessidades do país./Ao ver do Ministério Público, a mais que oportuna e necessária recente evolução da jurisprudência do TCU para considerar a omissão inicial injustificada como motivo bastante para a irregularidade das contas, ainda que afastado o débito mediante sua prestação tardia, deve ser secundada por rigorosa aplicação da sanção pecuniária prevista em sua lei orgânica, tendo em vista não só o caráter retributivo da pena em relação ao responsável diretamente envolvido, mas também o caráter preventivo, inibidor de novas condutas omissivas tanto pelo próprio responsável como pelos demais gestores da Administração Pública./A atuação pedagógica do Tribunal de Contas da União não se dá apenas por meio de suas sempre bem-vindas e oportunas recomendações e determinações corretivas, mas também e com intensa efetividade por intermédio das sanções que aplica e que rapidamente são dadas a conhecer no seio social e no meio dos gestores públicos./É preciso mudar profundamente a cultura de descaso com a prestação de contas, infelizmente reinante entre os gestores públicos, subproduto de uma cultura de impunidade deveras arraigada em nossa Administração Pública. De fato, o Brasil é leniente com a desídia, com a negligência, com a incompetência para bem gerir os recursos públicos, quando o que precisamos é justamente de rigor. A sociedade brasileira reclama, com toda razão, da absoluta falta, como regra geral, de qualidade da gestão pública./É preciso inverter a postura do gestor público, especialmente dos que gerem recursos de convênios federais. É preciso que, a partir da assinatura do convênio, seu signatário, daquele instante mesmo em diante, tenha presente o tempo todo a preocupação não só de bem gerir, mas também de bem demonstrar a boa gestão dos recursos que lhe estão sendo confiados, exigindo a pertinente documentação, guardando-a corretamente e apresentando-a tempestivamente./Isso não é formalismo! Isso é respeito com a sociedade que suporta pesadíssima carga tributária e, mais que respeito, é postura indutora de qualidade. O Controle Externo há de ser exigente. A sociedade brasileira clama por um Controle Externo exigente. A leniência é a mãe do desmazelo, da desídia, da negligência e do desapreço à ordem legal e à boa gestão dos recursos públicos. Afinal, por que se preocupar com o correto cumprimento dos termos de um convênio, com o bom e regular emprego das verbas recebidas e com a apresentação tempestiva da prestação de contas se, ao fim, tudo é compreensível e tolerável, se tudo se transforma em ressalvas e determinações para o futuro cumprimento da lei e dos princípios administrativos?/Dessa forma, se o Tribunal agir com rigor em casos da espécie, por certo, estará contribuindo para coartar esta grave irregularidade atinente ao descumprimento do dever de prestar contas dos recursos públicos geridos no prazo acordado no termo de convênio e, por conseqüência, para induzir a boa e regular aplicação destes valores, pois, se o gestor está desde o início preocupado em agir corretamente e assim o demonstrar, com muito maior probabilidade sua gestão será boa e correta./Cumpre, pois, em linha de coerência com essa profunda compreensão dos deveres do administrador público e de sua relação com a sociedade, sancionar adequadamente, nos termos da Lei 8.443/1992 e do Regimento Interno/TCU, as condutas desidiosas, negligentes e desrespeitosas com a coisa pública./Este Corte, frise-se, deu importantíssimo passo nesse sentido com a evolução de sua jurisprudência (v.g., Acórdãos 32/2008, 1.316/2007, 1.213/2007, 269/2007 - 2ª Câmara e 1.580/2007, 124/2007, 41/2007 - 1ª Câmara)'" (TRF5, 1T, AC 523793, Rel. Des. Federal Francisco Cavalcanti, j. em 10.05.2012). 7. Pelo parcial provimento da apelação.

(AC 200882010028647, Desembargador Federal Francisco Cavalcanti, TRF5 - Primeira Turma, DJE - Data::13/06/2013 - Página::226.)

Ademais, na hipótese em comento, não se trata de mero atraso na prestação de contas, mas sim decurso de vários anos, vez que somente em 2012, após o julgamento pelo TCU, o réu ofertou petição, com subsequente pedido de revisão protocolado em 2013, após a notificação para a presente demanda judicial.
Destarte, considerando que as conta deveriam ter sido apresentadas em 2008, não se verifica mero atraso na sua apresentação, mas sim flagrante conduta omissiva ilegal do réu, que, embora devidamente notificado, em mais de uma oportunidade, quedou-se inerte ao chamado dos órgãos de fiscalização (Controladoria-Geral da União e Tribunal de Contas da União).

Resta configurado, portanto, a violação ao dever de probidade do réu, por não ter prestado as contas referentes ao convênio acima mencionado, configurando ato de improbidade que atenta contra o princípios da administração pública, mediante a conduta preceituada no inciso VI, do artigo 11, da Lei n.º 8.429/92 ("deixar de prestar contas quando estava obrigado a fazê-lo").

Assim, uma vez caracterizada a violação de princípio regente da atividade estatal pelo gestor público, impõe-se a aplicação das sanções previstas na lei de improbidade, malgrado não se possa concluir pela ocorrência de prejuízo ao erário ou enriquecimento ilícito.

Sobre o preceito abstrato, tratando-se de uma espécie de "norma de reserva", no dizer de Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves, o tipo do artigo 11 permite a configuração do ato de improbidade, ainda que a conduta não tenha causado danos ao patrimônio público ou acarretado o enriquecimento ilícito do agente, sempre que restar demonstrada a inobservância dos princípios vetores da atividade administrativa (1).

A propósito, apesar da controvérsia quanto à necessidade ou não de prova da má-fé e desonestidade para o tipo em exame - violação de princípios -, a conduta do réu traduz de forma assaz a ausência de boa-fé e sua parcialidade para com a Administração Pública.

Assim, não obstante a dissensão doutrinária e jurisprudencial quanto à necessidade ou não da comprovação do dolo para a caracterização do ato ímprobo, no caso concreto, tenho como certa a presença do elemento subjetivo anímico do agente, relacionado à sua intenção em praticar as condutas ímprobas, descortinadas pelas circunstâncias e pelo próprio comportamento do réu.

Portanto, conclui-se pela caracterização do ato ímprobo perpetrado pelo réu, na modalidade de violação aos princípios da administração pública, restando necessário, a partir de então, realizar a dosimetria da reprimenda a ser imposta no decreto condenatório.

Da dosimetria das sanções previstas no artigo 12, III, da Lei nº. 8.429/92
Deve o magistrado, em casos de condenação por ato de improbidade, observar os critérios previstos na LIA, especialmente o artigo 12, parágrafo único, não sendo imperiosa a aplicação cumulativa das sanções se a extensão do dano e a reprovabilidade da conduta, em juízo de proporcionalidade, assim não indicarem a cominação.

A sanção deve, pois, ser compatível com o ato de improbidade perpetrado, em respeito ao princípio da proporcionalidade, sopesando-se a gravidade do agir do agente ímprobo e as consequências para a Administração Pública. O órgão jurisdicional deve proceder à verificação da compatibilidade entre as sanções, o fim visado pela lei e ilícito praticado. Os critérios da fixação da reprimenda estão previsto no parágrafo único do artigo 12, quais sejam: a extensão do dano e o proveito patrimonial.

No vertente caso, não há comprovação do prejuízo econômico ao erário, nem tampouco do enriquecimento ilícito, até porque o objeto de apuração restringiu-se ao rompimento dos deveres jurídicos pelo agente ímprobo.

Diante dos critérios apontados acima e das peculiaridades do caso concreto, em um juízo de proporcionalidade/razoabilidade, passo a fixar as sanções devidas ao réu.

Tenho como inaplicável a sanção de perda da função pública, por não guardar razoabilidade com o ato de improbidade ora reconhecido, sem olvidar que o término do mandato ocorreu em 2008.

Por outro lado, é adequada à espécie a sanção de suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 03 (três) anos, pois o réu violou dever de prestação de contas, de maneira a frustrar as justas expectativas de toda a população.

O pagamento de multa civil pelo réu também se mostra razoável e pertinente, no patamar de 05 (cinco) vezes o valor da remuneração percebida pelo agente ao tempo dos fatos, pois não exerceu com zelo os deveres do cargo.

O réu deve ser impedido de contratar com o Poder Público e receber benefícios ou incentivos fiscais, direta ou indiretamente, pelo prazo de 03 (três) anos, em decorrência da conduta ímproba na atuação como agente público.

Por fim, consoante acima indicado, diante da peculiaridade do ato de improbidade (violação de princípio administrativo), não se justifica a condenação do réu às sanções de ressarcimento dos danos causados ao patrimônio público, nem à perda dos valores acrescidos ilicitamente.

III. Dispositivo

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido ministerial, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil, c/c artigo 12, III, da Lei de Improbidade Administrativa (LIA), para condenar o réu pela prática de ato de improbidade caracterizado pela violação de princípio administrativo, por descumprimento do dever de prestação de contas, nos seguintes termos:

(a) ao pagamento de multa civil no patamar de 05 (cinco) vezes o valor do subsídio recebido ao tempo dos fatos, a ser devidamente atualizado pelo índice ditado pela taxa SELIC, que contempla, ao mesmo tempo, os juros e a correção monetária, cuja importância deverá ser depositada em favor da União (artigo 18, LIA);

(b) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03 (três) anos;

(c) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 03 (três) anos, a ser comunicada à Justiça Eleitoral após o trânsito em julgado.

Considerando que o autor decaiu de parte mínima do pedido (artigo 21, parágrafo único, do Código de Processo Penal), condeno o réu ao pagamento de custas processuais e honorários de sucumbência, fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, devendo tal monta ser revertida em proveito do Fundo de Defesa dos Direito Difusos.

A sanção de suspensão dos direitos políticos só terá eficácia após o trânsito em julgado da sentença (artigo 20, LIA).

Os valores de condenação acima descritos deverão ser devidamente atualizados em consonância com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, quando do cumprimento do julgado.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Petrolina, 21 de julho de 2014.